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Foto do escritorBerenice Cunha Wilke

GLÚTEN - DOENÇA CELÍACA

Atualizado: 15 de abr. de 2024

Quando eu me formei em medicina, a doença celíaca era uma doença relativamente rara, que acometia crianças nos primeiros anos de vida. O início da doença coincidia com a introdução das farinhas na alimentação e a criança apresentava uma diarreia crônica associada a baixa imunidade, emagrecimento e apatia. A criança que, antes da introdução do glúten, era saudável passou a ficar sempre enferma. Após o diagnóstico e retirada do glúten da dieta a criança voltava a sorrir, ganhar peso e as fezes voltavam ao normal. Em qualquer reintrodução, mesmo que acidental, das farinhas na alimentação a doença voltava.


Anos mais tarde, a incidência da doença celíaca começou a aumentar e os estudos mostraram que ela poderia ser encontrada em todas as idades, com maior ou menor quantidade de sintomas. Ela chegou a ser diagnosticada em mulheres na pós menopausa, que nunca haviam apresentado nenhum sintoma dessa doença na vida, e que foram diagnosticadas por outras consequências dessa doença como fratura do fêmur e câncer intestinal.


O QUE É A DOENÇA CELÍACA


Embora tradicionalmente vista como uma doença pediátrica caracterizada por má absorção, atualmente é vista como uma doença imunológica com manifestações sistêmicas que afeta todas as idades.


A doença celíaca é uma doença autoimune, ou seja, as próprias células de defesa imunológica agridem as células do organismo, causando um processo inflamatório.


Na doença celíaca, a inflamação é provocada pelo glúten, proteína presente no trigo, aveia, cevada, centeio e malte. Esse processo inflamatório, que no caso ocorre na parede interna do intestino delgado, leva à atrofia das vilosidades intestinais, gerando diminuição da absorção dos nutrientes.





PREVALÊNCIA


A prevalência da doença celíaca varia entre 1 a 2% da população e vem aumentando. É levemente mais frequente em mulheres.


SINTOMAS


A doença celíaca é mais facilmente diagnosticada nos casos de diarreia crônica que ocorre por mais de 30 dias. Ela pode causar também constipação intestinal, aftas, vômitos e muitos gases.


Os principais sintomas da doença celíaca estão relacionados à má absorção de nutrientes e são: cansaço, falta de ar, queda de cabelo, dificuldade de crescimento em crianças e atraso na puberdade, diminuição da imunidade causando infecções de repetição, hipoplasia do esmalte dental, doença hepática e biliar e carência de vitaminas e minerais como o ferro (anemia) e cálcio (osteoporose).


Na pele pode causar ressecamento, dermatite herpetiforme, eczemas e outras lesões. São comuns também alterações emocionais como depressão, ansiedade e falta de apetite. É importante lembrar que algumas pessoas podem ter poucos ou nenhum sintoma. A falta de tratamento da doença pode causar o surgimento de tumores no intestino ou linfoma.


DOENÇAS ASSOCIADAS


A doença celíaca também está associada a um risco aumentado de doenças autoimunes, incluindo tireoidite de Hashimoto, doença de Graves e diabetes tipo 1.


DOENÇA GENÉTICA E AMBIENTAL


A doença celíaca é uma doença multifatorial que associa fatores genéticos e ambientais.


O papel do glúten no desencadear da doença foi estabelecido pela primeira vez em 1950.


O motivo pelo qual a prevalência da doença celíaca venha aumentando e ela se desenvolva em algumas pessoas, e não em outras, permanece sem resposta.


Embora a ingestão de glúten seja necessária para o desenvolvimento da doença celíaca, ela não explica por que nem todos os indivíduos geneticamente predispostos, que consomem glúten, desenvolvem essa doença, nem por que a doença celíaca possa se desenvolver mais tarde na vida, apesar de muitas décadas de ingestão de glúten.


Estudos observacionais epidemiológicos e prospectivos implicam que uma série de fatores ambientais afetam o desenvolvimento da doença.


Estudos genéticos e imunológicos revelaram a importância dos principais genes que aumentam a suscetibilidade dessa doença que são genes HLA e não-HLA e as moléculas codificadas pelos genes HLA-DQA1 e HLA-DQB1 que estão associadas com a doença celíaca formando os heterodímeros DQA e DQB.


Outros SNPs (variações genéticas de um nucleotídeo único) não HLA são também associados ao aumento da frequência da doença celíaca.


A teoria emergente do desenvolvimento da doença celíaca é aquela em que fatores ambientais aumentam o risco em indivíduos geneticamente predispostos, modificando o contexto imunológico, fazendo com que o glúten em vez de ser tolerado pelo organismo passe a desencadear uma reação imunológica de auto agressão.


Por ter uma base genética a doença celíaca pode acometer várias pessoas da mesma família. Sempre que fizermos o diagnóstico em uma pessoa, todos os parentes de primeiro grau devem ser investigados, pois podem apresentar a doença mesmo sem apresentarem os sintomas.


O que permanece menos compreendido é como ocorre a perda de tolerância ao glúten.


O MICROBIOMA NA DOENÇA CELÍACA

A colonização microbiana ocorre ao nascimento e molda o desenvolvimento do sistema imunológico sistêmico, mucosa intestinal e da barreira intestinal. Essas interações hospedeiro-micróbio continuam por toda a vida, e uma interrupção dessas interações, através de composição ou funções bacterianas alteradas, foi associada ao aumento do risco de uma série de doenças auto-imunes ou inflamatórias, como a doença celíaca.


A composição alterada da microbiota em pacientes com doença celíaca pode representar um modificador ambiental do desenvolvimento dessa doença.


Estudos recentes sugeriram que a microbiota de pacientes com doença celíaca pode abrigar mais bactérias patogênicas ou pró-inflamatórias.


DIAGNÓSTICO


O diagnóstico classicamente é feito pelas atrofia das vilosidades coriônicas encontrado na biopsia intestinal. Atualmente, exames de sangue mais sofisticados como IgA antitransglutaminase tecidual e IgA anti endomísio estão sendo considerados suficientes para o diagnóstico, sem a necessidade da biópsia intestinal. Outro marcador também presente no sangue é a glidina deaminada (IgA e IgG).


TRATAMENTO


Não há cura para a doença celíaca.


O melhor tratamento ainda é retirar da dieta os alimentos que contenham glúten - trigo, centeio, cevada, aveia e malte, responsável por desencadear a inflamação.


Essa dieta apresenta um impacto na vida social das pessoas que precisam estar conscientes dos problemas advindos do glúten para que essa recomendação seja seguida por toda a vida, ou até que a ciência apresente outras opções de tratamento.


Devido ao grande risco que o consumo de glúten oferece para os celíacos, todos os alimentos industrializados precisam especificar em seus rótulos se contém glúten ou não.







Sou Dra. Berenice Cunha Wilke, médica formada pela UNIFESP em 1981, com residência em Pediatria na UNICAMP. Obtive mestrado e doutorado em Nutrição Humana na Université de Nancy I, França, e sou especialista em Nutrologia pela Associação Médica Brasileira. Também tenho expertise em Medicina Tradicional Chinesa e uma Certificação Internacional em Endocannabinoid Medicine. Lecionei em universidades brasileiras e portuguesas, e atualmente atendo em meu consultório, oferecendo minha vasta experiência em medicina, nutrição e medicina tradicional chinesa aos pacientes.


Para saber mais:


Gut. 2018 Aug; 67(8): 1410–1424. Outcome measures in coeliac disease trials: the Tampere recommendations. Jonas F Ludvigsson et all.


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