A síndrome de Mowat-Wilson (OMIM # 235730), descrita pela primeira vez em 1998, é uma condição rara, sendo que pouco mais de 350 casos foram descritos na literatura até o momento. Acredita-se que afete cerca de 1: 50.000 a 70.000 nascidos vivos.
Além dos casos descritos na literatura, diversos outros casos vêm sendo diagnosticados através de exames genéticos, que estão se tornando a cada dia mais acessíveis, embora não tenham sido ainda incluídos na estatística geral dos casos.
Ela é causada por alterações no gene Zinc finger E-box Binding homeobox 2 ou ZEB2 (mutação ou deleção em heterozigose), localizado no braço longo do cromossomo 2q22. Mais de 100 mutações diferentes do ZEB2 foram identificadas em pessoas com síndrome de Mowat Wilson. Estas mutações levam quase sempre a inativação de uma cópia do gene, enquanto, que, em alguns casos, as mutações do gene levam a uma produção excessiva e não funcional da proteína codificada por esse gene.
A deficiência de ZEB2 interfere na formação de muitos órgãos e tecidos do corpo humano antes do nascimento. O desenvolvimento anormal de estruturas derivadas da crista neural, como o sistema nervoso e nas características faciais. O papel do gene ZEB2 no desenvolvimento dos nervos que controlam o sistema digestivo também pode explicar as alterações encontradas com frequência no sistema digestivo.
O diagnóstico é feito pela análise molecular do gene ZEB2, que pode ser feito pelo exame genético Array CGH. Quando o diagnóstico não é feito pelo Array CGH deveremos fazer o exame genético EXOMA.
A síndrome de Mowat - Wilson é caracterizada por um amplo espectro de manifestações clínicas que variam segundo o grau da alteração encontrada no gene ZEB2:
Características faciais específicas:
Testa alta,
Lóbulos das orelhas levantados com uma depressão central,
Ponta nasal arredondada com columela proeminente e ponte nasal larga,
Hipertelorismo - aumento da distância entre os olhos,
Olhos profundos,
Estrabismo,
Maior afastamento medial das sobrancelhas,
Queixo triangular proeminente,
Dentes amplamente espaçados e / ou mal posicionados com apinhamento dentário.
2. Anomalias musculoesqueléticas podem ser várias, sendo as mais frequentes:
Dedos delgados e afilados,
Calcâneo valgo leve,
Dedos longos,
Pés planos,
Escoliose.
3. Cardiopatias congênitas estão presentes em 60,5% dos pacientes:
Persistência do canal arterial,
Defeitos do septo atrial e ventricular,
Estenose pulmonar e coarctação da aorta.
4. Alterações oculares:
Estrabismo (presente em 56,8% das pessoas com a síndrome),
Astigmatismo,
Miopia.
5. Outros aspectos clínicos:
Constipação (presente em 43,5% das pessoas com a síndrome),
Doença de Hirschsprung (presente em 30,6% das pessoas com a síndrome),
Anomalias urogenitais (presente em 61,25%das pessoas com a síndrome), em particular hipospádia e criptorquidia,
Baixa estatura.
6. Alterações neurológicas e do neuro:
Microcefalia (presente em 84% das pessoas com a síndrome),
Malformações cerebrais sendo que cerca de 80% dos pacientes apresentam anomalias do corpo caloso e/ou do hipocampo
Epilepsia (presente em 75 a 80% das pessoas com a síndrome), muitas vezes de difícil controle requerendo tratamento poli medicamentoso,
No Eletroencefalograma é frequente observar um estado elétrico epiléptico durante o sono,
Distúrbios do sono,
Comprometimento cognitivo e comportamental.
7. Alterações do sistema digestivo devidas a alterações do sistema nervoso entérico e periférico:
Doença de Hirschsprung,
Constipação (mesmo sem doença de Hirschsprung),
Dor abdominal,
Diminuição da sensibilidade a dor, podendo ocasionar problemas graves.
8.Aspectos de desenvolvimento e cognitivos:
Atraso no desenvolvimento geralmente observado desde os primeiros meses de vida, com hipotonia frequentemente observada como um dos primeiros sintomas,
Marcos de desenvolvimento, como sentar e andar, são muito atrasados,
Pode ocorrer atraso para andar ou não chegar a conseguir a andar,
Habilidades motoras finas e habilidades adaptativas são geralmente prejudicadas,
A fala geralmente é prejudicada, sendo que alguns pacientes não conseguem falar ou tem a linguagem limitada a poucas palavras,
Linguagem receptiva conservada na maior parte dos casos,
Deficiência intelectual de moderada a grave.
9. Aspectos comportamentais e psicopatológicos:
Comportamento feliz com sorrisos frequentes,
Estereotipias motoras.
10. Alterações urogenitais:
Hipospádia em homens.
TRATAMENTO
A síndrome de Mowat-Wilson não apresenta um tratamento específico, embora diversos estudos estejam em andamento para que um tratamento voltado a correção da alteração genética do ZEB2 possa ser proposto.
O tratamento das manifestações da síndrome é feito, de forma individualizada, pelos especialistas apropriados para cada uma das manifestações da síndrome, como as anomalias dentárias, convulsões, anomalias oculares, defeitos cardíacos congênitos, constipação crônica, doença de Hirschsprung, anomalias geniturinárias e anomalias de pectus do tórax e/ou anomalias do pé/tornozelo.
As intervenções educativas, fonoaudiológica, fisioterápicas e de terapia ocupacional são necessárias desde a infância e propostas também de forma individualizada.
Fig 1- HMF - Criança de 5 anos que apresenta a síndrome de Mowat Wilson - foto gentilmente cedida pela família.
Fig 2. RCP - Adolescente que apresenta a síndrome de Mowat Wilson - foto gentilmente cedida pela família.
Fig 3 - Phenotype and genotype of 87 patients with Mowat-Wilson syndrome and recommendations for care.
Sou Dra. Berenice Cunha Wilke, médica formada pela UNIFESP em 1981, com residência em Pediatria na UNICAMP. Obtive mestrado e doutorado em Nutrição Humana na Université de Nancy I, França, e sou especialista em Nutrologia pela Associação Médica Brasileira. Também tenho expertise em Medicina Tradicional Chinesa e uma Certificação Internacional em Endocannabinoid Medicine. Lecionei em universidades brasileiras e portuguesas, e atualmente atendo em meu consultório, oferecendo minha vasta experiência em medicina, nutrição e medicina tradicional chinesa aos pacientes.
Para acompanhar pesquisas em andamento:
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Midias Sociais:
Para saber mais:
ZEB2, the Mowat-Wilson Syndrome Transcription Factor: Confirmations, Novel Functions, and Continuing Surprises.
Birkhoff JC, Huylebroeck D, Conidi A.Genes (Basel). 2021 Jul 3;12(7):1037. doi: 10.3390/genes12071037.
Cordelli DM, Di Pisa V, Fetta A, Garavelli L, Maltoni L, Soliani L, Ricci E.
Genes (Basel). 2021 Jun 27;12(7):982.
Giulia Gorrieri 1, Serena Tamburro et all
Stem Cell Res. 2024 Apr:76:103333.
Ivan Ivanovski 1 2, Olivera Djuric et all
Genet Med . 2018 Sep;20(9):965-975.